Certo dia, estava caminhando pelo escritório, numa das muitas consultorias TI que trabalhei, e vi um dos diretores com uma cara péssima. Ele não era geralmente um cara muito bem humorado, mas dava pra ver que ele estava além de aborrecido, muito abatido. Eu perguntei pra ele "E aí João, muito trabalho?", pensando que fosse isso que pudesse estar deixando ele tão esgotado. E ele me disse uma frase mágica, que me fez todo sentido: "Paulo, o problema não é ter muito trabalho, isso eu aguento. O que eu não aguento é a aporrinhação!"
Foi aí que percebi o quanto isso faz sentido. Nesses anos todos, tive muitos projetos críticos, cheios de complexidade, alta demanda e risco, que exigiram muitas e muitas horas de planejamento, desenvolvimento, testes e acompanhamento. Foram vários projetos que exigiram 12, 14, 24, 36, 70 horas de trabalho contínuo, muitos finais de semana e feriados na frente do computador e junto da equipe. E na grande maioria das vezes, isso me gerava apenas cansaço. Isso mesmo, cansaço, que depois de algumas horas dormindo, me alimentando bem, eu me recuperava tranquilamente.
Agora, o que me deixava pra baixo, derrubado, tenso, trabalhando com os dentes trincados, os ombros travados, a cabeça pesada e os nervos à flor da pele, era exatamente isso: aporrinhação! Pra quem não está familiarizado com o termo, significa "encheção de saco", reclamação, cobrança excessiva, ameaças e estresse por micro gerenciamento.
E não é só comigo. Quanto mais converso com colegas, tanto pares como colaboradores meus e líderes também, vejo que passam pelo mesmo processo. E isso tem tudo a ver com a cabeça do líder, que não sabe administrar bem suas expectativas sobre os resultados.
Vê, a pressão é sempre grande quando pensamos que algo precisa ser entregue dentro daquilo que sempre falamos: prazo, custo e qualidade. Cada vez mais, para uma empresa se manter competitiva, o mínimo a ser feito é cumprir esses três pontos sobre produtos ou serviços. Porém, a forma de fazer a equipe chegar lá é o que faz a diferença.
Nesse processo de aporrinhar a equipe, é preciso que cada gestor/líder leve em consideração os seguintes pontos:
Conhecimento de si mesmo
Conhecimento das pessoas da equipe
Conhecimento do que precisa ser feito
Se o gestor não se conhece, não sabe como atua sob pressão e nem o impacto que causa nas pessoas, vai ser difícil se controlar para não espanar e para não botar a pressão errada sobre a equipe. Não quer dizer com isso que você vai deixar todo mundo solto pra fazer o que quer, nada disso! Mas quer dizer que você tem que focar a mente das pessoas na entrega e facilitar o trabalho delas, mais do que deixá-las pensando se serão demitidas ou se a empresa vai fechar.
Veja que o segundo ponto não é conhecer a equipe, mas as pessoas da equipe, ou seja, conhecer individualmente cada um dos integrantes da equipe, para saber o que se passa na vida de cada pessoa, o que isso pode impactar nas entregas por vir, em cada aspecto necessário. Não se trata de passar horas com cada um, isso é impossível! Mas de ter contatos precisos, para saber da saúde e situação de cada um e de seus familiares próximos, pois isso pode ser determinante para como vai ser o dia, a semana, o mês e até o ano dessa pessoa.
Por fim, precisa conhecer bem o que precisa ser feito. Entender do assunto, do que se espera como resultado, mas também a realidade dos problemas que estão ocorrendo. Num primeiro olhar, é fácil criticar algo que deveria ser simples mas está sendo demorado pra fazer, quando não se entende os verdadeiros problemas por trás disso. Sem esse entendimento, a chance do problema se manter ou voltar a acontecer é enorme! Fale com as pessoas, ouça seus pontos de vista sobre qual o problema e é claro, também para saber qual pode ser a solução.
A verdade sobre uma boa liderança é que ela facilita a vida de quem está na frente do trabalho. Ótimos líderes não ficam no óbvio e buscam saber a realidade, que muitas vezes escapam suas visões pré-concebidas. E da mesma forma, não pressione desnecessariamente a equipe. Se houver problemas individuais, trate-os individualmente, mas não coloque todos no mesmo saco e de bronca em todo mundo. Você não dá o recado aos que estão em erro e desmotiva os que estão trabalhando bem.
O mundo já está cheio de gente chata. Não seja você mais um! Seja antes um incentivador e facilite que as pessoas da sua equipe possam dar o seu melhor cada dia. Seu trabalho e ajudar sempre, mesmo que não façam isso por você!
Um abraço,
Paulo Bomfim
Meu amigo Paulo, ótimo texto. Reflexivo!